A data de 1946 marca o lançamento do livro A Evolução do Capitalismo, cujo título original, Studies in the Development of Capitalism, demonstra ser mais adequado à sua essência. Como esclarece Dobb no prefácio, a obra deve ser vista como uma “coletânea de estudos históricos”, escritos em diferentes tempos — as primeiras versões dos capítulos iniciais, segundo o autor, datam dos anos 1920 (DOBB, 1983, p. 2).
Isso faz com que o economista inglês muitas vezes se posicione favorável ou contrariamente a determinadas concepções hegemônicas, seja no campo histórico, seja no campo econômico. Compreendendo que seja possível dividir o tratamento de Dobb à disputa da transição, este texto é secionado em quatro partes principais.
As duas primeiras partes lidam com a visão do autor em relação ao tema, com questões menores permeando o texto, enquanto a terceira e quarta partes tratam da recepção da perspectiva de Dobb por dois autores: Paul Sweezy e Ellen Meiksins Wood, respectivamente.
(1) Elementos preliminares à análise e a visão negativa de Dobb
Dobb define1 feudalismo a partir da relação entre produtor subalterno e apropriador soberano, sendo possível entendê-la como a relação entre o vassalo e o suserano ou entre um artesão que produz para um superior (SWEEZY, 2004). Essa amplitude permite enfatizar o caráter socioeconômico da servidão, deixando em segundo plano tanto a relação jurídica de vassalagem quanto a relação puramente econômica entre produção e circulação (MARIUTTI, 2000).
A abordagem do autor deve sua essência à necessidade de caracterizar efetivamente o feudalismo como um modo de produção, como explicitam Brenner (1978) e Mariutti (2000), cuja característica principal baseia-se mais em conteúdo do que em forma. Isto é, o feudalismo é um modo de produção servil, em que a satisfação de necessidades econômicas dum superior é alcançada pela apropriação da produção dum subalterno, em caráter obrigatório e coercitivo, não importando tanto (1) a forma que a coerção assume — se deriva de poder político, jurídico ou se é fruto da tradição; e (2) a forma pela qual as necessidades são satisfeitas — se mediante renda-trabalho, renda-espécie ou renda-dinheiro (DOBB, 1987).
Dobb ecoa Marx ao aludir à relativa independência do produtor feudal: embora subordinado a algum senhor, ele se encontra ainda na posse dos meios de produção e de subsistência. Ou seja, ele é independente para produzir, mas não é livre — a liberdade será justamente um dos pressupostos para a concretização do domínio do trabalho pelo capital e da hegemonia capitalista (MARIUTTI, 2000).
A questão que se erige, portanto, é o que o autor entende por modo de produção. Infelizmente, o economista inglês não define explicitamente sua compreensão do conceito, o que motivou Mariutti (2000) a tentar entendê-la a partir de passagens selecionadas da obra do autor. Em primeiro lugar, Dobb vê a necessidade de definir modo de produção como algo além do mero estado da técnica, ou seja, da situação corrente nos âmbitos tecnológico e científico de auxílio à produção, visto que as formas de propriedade e as relações sociais devem ser levadas igualmente em conta.
No entanto, um modo de produção nunca aparece em sua forma básica:
No interior de todo e qualquer modo de produção existe uma complexa mistura de elementos de períodos anteriores e de novas relações que podem coexistir paralelamente, estabelecendo ou não relações de influência mútua. A função destas relações pode variar em sentido e grau: pode auxiliar na manutenção ou na desestabilização da sociedade (MARIUTTI, 2000, p. 15)
Por um lado, tal interpretação deslegitima a crença de que para cada período histórico há um, e somente um, modo de produção em atividade. Para cada período histórico, há, na verdade, uma série de modos de produção concorrentes, viabilizados ao longo da História. Isso está de acordo com o pensamento maduro de Marx, em que as relações de produção têm mais importância do que o estado das forças produtivas, ou a capacidade de produção social, na especificidade e na caracterização do modo de produção (BRENNER, 1978; MARIUTTI, 2000; SZELÉNYI, 2011).
Por outro lado, essa visão faz com que o ponto limítrofe entre um modo de produção e outro, seu sucessor, torne-se difícil de acessar, até mesmo por não ser apenas um ponto, mas pontos, ramificações, cuja sustentação prática é fornecida pelo conceito de formação social. Apesar disso, sempre há um modo de produção hegemônico, que alcança o mais alto nível de influência e domínio sobre as sociedades humanas, podendo ser notado visivelmente (MARIUTTI, 2000).
A partir desse ponto, o autor procede de forma negativa, de modo análogo à teologia apofática, que tenta abordar o deus cristão a partir de afirmações sobre o que ele não é. Da mesma forma, Dobb aborda inicialmente o feudalismo a partir de concepções insuficientes, baseando-se nelas para sugerir interpretações mais apropriadas. Assim, logo no início do segundo capítulo, ele se opõe à visão de que a mera expansão comercial, com a penetração da troca de mercadorias na autossuficiência feudal, em conjunto à normalização da renda-dinheiro teriam diretamente causado o desabamento do feudalismo e o surgimento do capitalismo (BRENNER, 1978; WOOD, 2002).
Houve realmente a popularização da renda-dinheiro em detrimento da renda-trabalho2 e da renda-espécie, o que poderia justificar o afrouxamento de laços servis e consequentemente o fim da servidão e do feudalismo. A partir disso, estabelece-se uma conhecida relação de oposição entre dinheiro e o modo de produção feudal: o dinheiro seria o solvente de relações servis por excelência. Para essa lógica, quanto mais próximo o campo estivesse de centros comerciais, onde o dinheiro circula livremente, mais rapidamente suas relações de servidão se extinguiriam. Na Inglaterra, por exemplo, faria sentido pensar que as relações feudais acabariam primeiramente nas proximidades do mercado londrino, grande centro comercial do país no século XIV. Mas aconteceu justamente o inverso: o fim da prestação de serviços, com sua conversão em pagamentos em dinheiro, ocorreu em primeiro lugar nos pontos mais distantes dos grandes mercados. No caso da Inglaterra, portanto, regiões distantes do mercado londrino substituíram precocemente a renda-trabalho (DOBB, 1987).
Para o resto da Europa, as justificativas para negar a antinomia comércio-feudalismo se tornam ainda mais explícitas devido à chamada segunda edição do feudalismo, denominação dada por Engels ao modo de produção do leste europeu à época dos Junkers. Tratava-se duma espécie de feudalismo com grandes propriedades e servidão mais incisiva, beirando a escravidão. Especificamente no leste europeu, mais do que não representar uma oposição ao feudalismo, o comércio tornou-se um aliado à sua segunda edição, pois a intensificação da exploração da mão de obra servil esteve ligada diretamente à exportação de produtos agrícolas e ao dinheiro (SKAZKINE, 2013).
Em síntese, admitir que o comércio ou dinheiro sozinhos destruíram as relações de servidão presentes nas diferentes partes da Europa é, no mínimo, exagero; no máximo, uma falsificação completa da História.
Outra visão negada por Dobb é a de que as cidades, nas quais as relações de troca de mercadorias e consequentemente de dinheiro ocorrem, representassem outra antítese em relação ao campo. Como prova disso, o autor aponta a subordinação inicial das cidades a autoridades feudais, ilustrando claramente uma relação servil entre uma localidade e outra e não uma oposição. Em outros termos, uma relação positiva, de aproximação, e não negativa, de afastamento (DOBB, 1987).
As cidades, para o autor, também não podem ser compreendidas como microcosmos do capitalismo. Além de ser uma interpretação eminentemente associada a autores como Henri Pirenne e Max Weber, cujos pensamentos encontram-se resumidos no primeiro capítulo, um outro motivo se apresenta nesse sentido:
[…] o artesanato e a produção de ‘mercadorias’ realizadas em seu interior era fundada nos códigos de conduta das corporações, cuja orientação não era a acumulação. A produção para o ‘mercado’ era vista, essencialmente, como um meio para preservar os ofícios, este sim concebidos como um fim em si. A lógica da produção mercantil capitalista teve, para poder andar sobre seus próprios pés, de destruir as relações sociais tradicionais no campo e as regulações das corporações (MARIUTTI, 2020, p. 16).
Ademais, em relação à cidade, sua pequena escala nos idos do século XV em países como a Inglaterra, por exemplo, impede a formação e a acumulação de capital. A exceção disso, segundo Dobb, encontra-se na Holanda e nas cidades italianas mercantis.
É verdade que o elemento comercial nutrido por tais comunidades reunia em suas mãos os primeiros germes do capital mercantil e prestamista que, mais tarde, seria empregado em grande escala, mas outros instrumentos de acumulação que não uma simples tendência do tipo bola de neve teriam de intervir antes que esse capital se tornasse tão dominador e ubíquo como sucederia em séculos posteriores (DOBB, 1987, p. 80).
Entretanto, como deve ser reiterado, essa condição não era generalizada e, portanto, tratava-se de pura exceção à regra.
Os burgueses da cidade também não chegavam a ameaçar o modo de produção senhorial3, segundo o medievalista Le Goff (1992), desde que fossem atendidas certas condições: a ausência de direitos senhoriais prejudiciais ao bom andamento da produção artesanal e do comércio; a permanência do controle burguês sobre a estrutura econômico-administrativa da cidade; a liberdade dos citadinos, cuja mão de obra deveria estar desprendida de quaisquer amarras senhoriais.
Mesmo nas vezes em que os dois grupos entravam em conflito, rapidamente chegavam a acordos agradáveis a ambos os lados, algo facilitado pelo modo de produção senhorial proporcionar à burguesia matérias-primas a baixo custo para o artesanato. Ou seja, apesar de eventuais disputas, havia uma espécie de mutualismo: “as cidades adaptavam-se ao modo de produção senhorial e, reciprocamente, os senhores aceitavam as cidades” (LE GOFF, 1992, p. 40).
Voltando à visão de Dobb, ela pode ser sintetizada a partir da sistematização realizada por Le Goff (1992) e reproduzida por Barros (2009), referente às perspectivas possíveis e existentes sobre a relação entre cidade e feudalismo. A primeira delas é a equivalência entre cidade e senhoria, entendendo o meio urbano como outro poder feudal; a segunda, por sua vez, é aquela contra a qual Dobb colide e assegura o oposto: a cidade seria algo naturalmente antifeudal; a terceira vê a cidade como um território exterior ao sistema feudal, mas o sistema urbano como aliado do feudalismo. A última delas, entretanto, é a própria visão do medievalista francês, que julgava errôneas todas as interpretações anteriores. A perspectiva validada por Le Goff compreende que cidade e feudalismo não eram equivalentes, opostas e nem aliadas, mas partes do que o historiador argentino José Luis Romero4 nomeou sistema feudoburguês.
A partir disso, é possível visualizar como Dobb em geral postula a relação entre o ambiente urbano e o modo de produção feudal de maneira próxima ao conceito defendido por Le Goff. Ou, ao menos, que o economista inglês se aproxima da terceira visão, que vê uma relação de aliança entre cidade e feudalismo. Uma visão suficientemente razoável, visto que o medievalista francês acha essa a opção mais interessante dentre aquelas consideradas insuficientes.
Como elucida Barros (2009, p. 294, grifos nossos), a perspectiva de Dobb, no sentido de não opor cidade e feudalismo, encontra amparo na historiografia corrente:
A tendência historiográfica atual fica por conta das duas últimas posições atrás mencionadas. Considera-se hoje em dia uma relação dinâmica entre a cidade e o feudalismo propriamente dito. Se a cidade e o mundo da produção feudal serão colocados como parte de um único sistema, ou se serão tratados como dois sistemas aliados ou complementares, esta já é uma opção que deverá assumir o historiador.
Dobb não nega a existência do movimento urbano contrário à subjugação feudal, fator que poderia ser interpretado como resquício da antinomia cidade-feudalismo. Entretanto, o autor defende que tal oposição pontual seja vista pelo prisma da tensão política entre nobres, de diferentes linhagens ou não, e entre nobres e camponeses. Portanto, essa aparente contradição é efeito e não causa da chamada crise geral do feudalismo, não estando presente ab initio e não podendo ser entendida como pertencente a uma ‘lei geral’ desse modo de produção.
Após explicitadas as formas pelas quais Dobb critica e nega certas interpretações do feudalismo, resta entender como o autor articula seu fim sem a facilidade de afirmar que bastou o comércio surgir para que as bases feudais estremecessem e ruíssem. O próximo subcapítulo, então, preocupa-se em estabelecer a visão positiva de Dobb.
(2) O apodrecimento feudal ou a visão positiva de Dobb
Dobb escolhe quatro fatores principais para explicar a ascensão do capitalismo: em primeiro lugar, e destacadamente, a produtividade limitada do feudalismo; a estagnação agrícola, combinando a queda no rendimento da terra ao fato de que o excedente na produção proporcionado por inovações técnicas na agricultura era expropriado pelo senhor feudal; o processo de subenfeudação aliado a contínuos ceifadores da capacidade produtiva, como as guerras e a peste; e finalmente, por consequência dos fatores anteriores, a fuga dos campos, que limitava ainda mais a agricultura, sobrecarregando novamente os produtores e intensificando as jacqueries (DOBB, 1987).
A combinação desses fatores aumentou a pressão exercida sobre os servos de forma generalizada. Mesmo o crescimento demográfico antes da peste não ajudou a suavizar a situação, visto que, embora a mão de obra crescesse, o acesso às terras e às próprias áreas cultiváveis não crescia em igual proporção:
É verdade que isso [o crescimento demográfico] teria servido para proporcionar mais mão-de-obra para sustentar o sistema e fornecer uma renda feudal adicional, mas, a não ser em regiões onde o aumento em números foi seguido por um aumento de terra cultivável disponível para os camponeses […], o resultado eventual tendia a ser um aumento na carga suportada pelos camponeses, devido à maior pressão sobre a terra disponível (DOBB, 1987, p. 56).
Isso impulsiona, por sua vez, o desgaste na relação entre o elemento subalterno e o elemento soberano. A necessidade crescente de renda da nobreza fundiária e a repulsa do campesinato pela manutenção da superexploração no campo geram um circuito retroalimentativo. Em termos marxistas, o antagonismo dos participantes da relação servil intensificou a luta de classes, tornando necessária uma transformação social para resolver essa contradição (WOOD, 2002).
Por conseguinte, Dobb, nesse aspecto, faz parte do grupo de que fala Robert Fossier na seguinte citação:
[…] argumenta-se, frequentemente, que esse excedente de trabalho exigido do camponês, para atender às taxas públicas de seu próprio senhor ou de um outro que dispusesse do direito de ban, paralisava o esforço produtivo visto que suas cargas de trabalho, conjugadas e excessivas, poderiam manter o homem na miséria ou no subdesenvolvimento (FOSSIER, 2018, p. 46).
Afinal, a renda do senhor depende exclusivamente da exploração do tempo de trabalho excedente daquele que está sob seu comando. No campo, o servo usualmente recebia uma porção de terra para fins de subsistência, na qual trabalha por certo tempo de forma contínua (HUBERMAN, 1972). O restante de seu tempo de trabalho, no entanto, tem lugar nas terras senhoriais e, caso seja pretendido um aumento na produtividade, só há duas opções. Uma delas é a redução do tempo de trabalho dedicado à subsistência. Se isso acontece, o servo pode usar o restante de seu tempo nas terras de seu senhor.
Como aponta Fossier (2018), contudo, a renda-trabalho sofreu um constante declínio ao longo do período medieval: no século IX, trabalhava-se de um a três dias semanais nas terras do senhor; no século XI, por sua vez, essa frequência havia decrescido para oito vezes ao ano, em momentos urgentes. Essa transformação da renda-trabalho fez com que não fosse interessante a opção pela redução do trabalho de subsistência, já que o possível aumento no rendimento seria desprezível, e o aumento da jornada de trabalho nas terras senhoriais tornou-se uma impossibilidade histórica.
A única opção restante ao senhor feudal, ávido por crescentes rendas, foi ordenar que o ritmo de trabalho de seus servos chegassem a níveis desumanos — tanto no sentido de ultrapassar as habilidades humanas quanto no sentido da consequente degradação da saúde do subalterno. Em vez de jornadas de trabalho mais longas, o senhor opta por jornadas de trabalho mais intensas em suas terras, para aproveitar ainda a existência mínima da renda-trabalho. De acordo com Dobb (1987), a situação se torna ainda mais aguda graças ao fenômeno da fuga dos campos em direção às cidades, o que diminui expressamente a quantidade de trabalhadores disponíveis.
Em síntese, Maurice Dobb crê que o declínio feudal foi motivado por contradições e antagonismos internos ao próprio sistema feudal (SWEEZY, 2004). Com sua negação das antinomias normalmente apontadas como causas para isso, que compõem o que Brenner (1978) denominou visão tecno-funcionalista, seu objetivo é demonstrar que mesmo o comércio e as cidades faziam parte do modo de produção feudal: como visto anteriormente, não eram fatores externos.
Como assevera Barros (2009, p. 295), o benefício dessa conceituação está no impedimento de contradições e tensões irresolvíveis presentes nas interpretações que postulam o antagonismo entre cidade ou comércio e feudalismo.
O Materialismo Histórico resolve esta contradição através da concepção dialética: um ‘modo de produção’ já carrega dentro de si as contradições fundamentais que, desenvolvidas para além de determinado ponto crítico, produzirão a sua própria superação através de uma revolução estrutural.
A partir disso, por explicar o processo de dissolução feudal mediante suas contradições internas, pode-se dizer que a interpretação dobbiana é essencialmente marxista, embora tenha motivado críticas de outros autores de igual vertente, lançando base para o que ficou conhecido pelo nome de debate da transição (MARIUTTI, 2000; WOOD, 2002; ANIEVAS e NIŞANCIOĞLU, 2015).
(3) Externo ou interno: Sweezy e a discussão original
Como reitera Mariutti (2000), o debate entre Sweezy e Dobb sucede uma discussão anterior, datada de 1940 e motivada pelo lançamento dos ensaios de Christopher Hill acerca da Revolução Inglesa. A partir dele, ocorre o choque entre dois pontos de vista diferentes. O primeiro entendia que a Revolução Inglesa havia sido uma revolução burguesa, responsável por efetivar a hegemonia do modo de produção capitalista na Inglaterra; a segunda perspectiva, no entanto, afirmava que a revolução foi mera defesa da burguesia contra ataques da nobreza feudal.
Dobb participou dessa discussão, que foi relevante para o desenvolvimento de alguns argumentos publicados em seu livro. Como exemplo de sua participação, em que demonstra sua verve marxista, Dobb argumenta em favor da necessidade de especificar, antes de qualquer intervenção, o modo de produção prevalente na iminência da revolução, para que seu “real significado” pudesse ser melhor compreendido (MARIUTTI, 2000, p. 6).
Além disso, como se tivesse preconizado seu debate com Sweezy, Dobb também:
[…] revelou o seu desconforto com o crescente emprego do termo ‘Capitalismo Mercantil’, que desviava as atenções da produção para a circulação, o que, na sua opinião, tornava a discussão ainda mais obscura. Mostrou-se favorável à tese de que a Inglaterra Tudor e Stuart ainda era feudal, embora já contivesse alguns elementos ‘capitalistas’ (MARIUTTI, 2000, p. 6).
Quatro anos após o lançamento da obra de Dobb, o também economista Paul Sweezy publica um artigo em resposta, ressaltando alguns pontos de discordância com a obra, intitulado Uma crítica. A revista em que o artigo original foi publicado, Science & Society, serviu de palco para as manifestações não só de ambos os autores, mas também de outros estudiosos, como Kohachiro Takahashi, Rodney Hilton e Christopher Hill (WOOD, 2002).
Nesse primeiro contato, Sweezy afirma que a abordagem de Dobb não conseguiu provar suficientemente seu ponto. Ao partir da equivalência entre feudalismo e servidão, Dobb teria falhado em estabelecer as leis gerais do funcionamento da forma clássica do feudalismo, presente no oeste europeu, motivo que o teria levado a usar dados do feudalismo ao leste em sua argumentação. Além disso, Sweezy diz ter a impressão de que em vez de descrever uma espécie dum sistema social, Dobb limita-se a descrever um gênero de sistemas sociais. Em outras palavras, Sweezy deixa a entender que Dobb teria generalizado demais o feudalismo (SWEEZY, 2004).
Um segundo ponto de discordância que se destaca é o entendimento, por parte de Sweezy, de que nenhum fator interno poderia permitir a transição do feudalismo ao capitalismo (MARIUTTI, 2000; WOOD, 2002). Para demonstrar sua visão, o autor recorre à definição de feudalismo oferecida por Dobb. Ao expandi-la, revelando supostamente seus pressupostos implícitos, Sweezy chega à conclusão de que a servidão como relação produtiva dominante, por ser inseparável da propriedade senhorial, engendra a hegemonia dos mercados locais em detrimento dos mercados mais distantes (SWEEZY, 2004).
Isso faz com que o feudalismo seja um sistema de produção voltado quase exclusivamente para a utilidade, isto é, um modo de produção em que não há valor de troca e nem valor generalizados, pois a produção não é realizada tendo em vista uma venda lucrativa futura: ela se limita ao consumo, pelo menos a nível estrutural, existindo nela hegemonicamente valores de uso. A lógica feudal, portanto, estaria baseada na produção de produtos estritamente úteis (SWEEZY, 2004).
Usando como autoridade o próprio Marx5, Sweezy cita a seguinte passagem de O Capital para desenvolver seu argumento:
No entanto, é evidente que em toda formação econômica da sociedade onde predomina não o valor de troca, mas o valor de uso do produto, o mais-trabalho é limitado por um círculo mais amplo ou mais estreito de necessidades, mas nenhum carecimento descomedido de mais-trabalho surge do próprio caráter da produção (MARX, 2017, p. 309).
Isto é, nas formações sociais em que é hegemônico o valor de uso, existe mais-trabalho ou trabalho excedente assim como no capitalismo, em que reina a produção de valores de troca. Mas a diferença, nesse âmbito, reside no fato de que não é a produção que torna necessário o mais-trabalho nas sociedades de valor de uso predominante. Afinal, como já visto, é uma especificidade histórica do capitalismo a contínua valorização do valor, a sujeição de toda a sociedade à expansão do capital, de forma indispensável.
Assim, sob o modo de produção feudal, não existiria pressão para a constante revolução dos meios de produção, diferentemente do que ocorre no capitalismo com o aumento inevitável da produtividade. Sweezy entende, a partir disso, que a sociedade feudal generaliza o fundamento da produção para o uso, fazendo com que ela se oriente sempre ao uso e à tradição, embora isso não represente ausência de instabilidades internas.
O problema, no entanto, é que mesmo as instabilidades possíveis jamais teriam poder suficiente para desestruturar o feudalismo, argumenta o autor. Como exemplos disso, Sweezy cita a competição entre os senhores por terras e servos, que cria um estado de guerra perpétuo, mas cujo resultado é apenas a intensificação do próprio sistema feudal6; e o crescimento populacional, origem duma população excedente incapaz de ser absorvida dentro da produção feudal e que recorre ao banditismo ou à mendicância, gerando instabilidade, mas não revolução (SWEEZY, 2004).
Como visto anteriormente, Dobb crê que a superexploração causada pela necessidade de rendas maiores foi fator determinante para a dissolução do sistema feudal e seu principal efeito, a fuga em direção às cidades, foi responsável por acelerá-la. Pode-se resumir essa visão dizendo que o feudalismo se autodestruiu. Nas palavras de Sweezy (2004, p. 45):
[…] de acordo com a teoria de Dobb a causa fundamental do colapso do feudalismo foi a superexploração da força de trabalho: os servos desertaram das propriedades senhoriais en masse, e os que permaneceram eram muito poucos e demasiadamente sobrecarregados para permitir que o sistema se mantivesse na sua antiga base. Foram esses acontecimentos, mais do que a expansão do comércio, que forçaram a classe dominante feudal a adotar os expedientes — comutação das prestações de serviço, arrendamento de terras dominiais a locatários etc. — que finalmente levaram à transformação das relações de produção nas regiões rurais.
Em relação à necessidade de rendas maiores por parte dos senhores, Dobb fornece quatro elementos explicativos: (1) o desprezo dos senhores pelos servos, vistos como mera fonte de renda; (2) as guerras e o banditismo; (3) a expansão populacional; e, por fim, (4) a extravagância crescente em festas e na vida social senhorial.
Sweezy, entretanto, parte de pressupostos diferentes, percebendo tanto as cidades quanto o comércio como fatores externos à lógica feudal. Afinal, se o comércio exige a existência de valores de troca para existir e se as cidades funcionam como local específico da troca de mercadorias, é impossível introduzi-los no sistema feudal, um sistema em que dominam os valores de uso. São dois sistemas irreconciliáveis para o autor.
Desse modo, Sweezy contra-argumenta que (1) e (2) eram lugares-comuns na era medieval. Portanto, no entendimento do autor, não seriam suficientes para estimular uma ruptura revolucionária. As opções (3) e (4), por sua vez, têm mérito para Sweezy, embora a terceira opção não seja tão razoável, visto que toda a população, produtora direta ou apropriadora da produção, cresceria na mesma proporção. Resta, então, o argumento que invoca a crescente extravagância das classes dominantes.
Mesmo essa explicação, entretanto, não é livre de problemas. Para que o argumento de Dobb não seja completamente descartado, Sweezy afirma, é preciso que elementos internos ao feudalismo justifiquem os gastos cada vez maiores do senhorio. Como questiona Sweezy (2004, p. 46-47), que crê na exterioridade do comércio em relação ao modo de produção feudal:
Mas essa crescente extravagância era uma tendência passível de explicação pela natureza do sistema feudal, ou reflete algo que ocorria fora do sistema feudal? […] Além disso, considerando-se o que se passava fora do sistema feudal, encontramos múltiplas razões para a crescente extravagância da classe dominante feudal: a rápida expansão do comércio a partir do século XI punha ao seu alcance uma quantidade de bens cada vez maior e mais variada.
É justamente por considerar o comércio como algo extrínseco ou até mesmo oposto ao feudalismo que Sweezy entende a impossibilidade de explicar a necessidade de rendas maiores partindo da visão de Dobb, que assume o comércio como parte integrante ou associada ao feudalismo (WOOD, 2002).
Em seguida, Sweezy se propõe a analisar a validade do efeito principal da superexploração feudal: a fuga dos servos. O autor admite que esse processo colaborou para a intensificação da crise do feudalismo no século XIV, mas acredita que Dobb não teve sucesso em defender que a opressão senhorial teria sido seu estopim. Em primeiro lugar porque os servos, caso resolvessem fugir dos campos, poderiam se tornar facilmente uma população errante por não terem onde permanecer, algo que Dobb não teria considerado. O risco da fuga seria, assim, muito grande (SWEEZY, 2004).
Ao mesmo tempo, Sweezy recorda que a deserção dos servos ocorreu junto ao crescimento das cidades nos séculos XII e XIII. Segundo o autor, as cidades eram atraentes para os servos por oferecer liberdade de emprego e a oportunidade, ainda que mínima, de ascensão social. Aliado a isso, a burguesia auxiliava a fuga devido sua necessidade de soldados e de mão-de-obra. A fuga dos campos, então, não pode ser vista somente a partir da superexploração: deve ser levada em conta a possibilidade de mudança que as cidades, fator também considerado externo ao feudalismo para Sweezy, representavam para a população rural (SWEEZY, 2004).
De modo geral, a discordância entre os autores é tanto metodológica quanto hermenêutica (MARIUTTI, 2000). Enquanto Dobb retira o poderio do comércio e das cidades como pontos explanativos de desequilíbrio do sistema feudal, por não serem antagonizados, propondo que o acirramento das lutas de classes explica a transformação da sociedade medieval, Sweezy aposta na incongruência entre feudalismo e o comércio nas cidades. Para este, o modo de produção feudal tende à conservação de práticas tradicionais e o comércio se estabelece como atividade dinâmica, como forma antediluviana do domínio do capital, sendo absurdo imaginá-los dentro do feudalismo.
(4) Ellen Meiksins Wood contra o modelo mercantil
A busca pela origem do capitalismo fez com que a historiadora norte-americana Ellen Meiksins Wood lançasse, em 1999, a obra The Origin of Capitalism. No livro em questão, antes de apresentar seu ponto de vista, a autora retoma as discussões anteriores, incluindo o debate entre Dobb e Sweezy, além do debate envolvendo Robert Brenner na metade da década de 1970 adiante.
Wood, é claro, procede dessa forma com o objetivo de criticar e diferenciar sua visão do que teria acontecido na passagem do feudalismo para o capitalismo da visão de outros autores. Segundo a autora, o problema maior das narrativas envolvendo o início do capitalismo está em sua circularidade: ao tentarem explicar de que modo esse sistema econômico ou modo de produção teria surgido, os estudiosos teriam tomado como pressupostos alguns princípios que se desenvolvem após a instauração do capitalismo (WOOD, 2002).
Um exemplo disso seriam as tentativas de abordar a necessidade capitalista de maximização de lucros e do aumento da produtividade sob o regime capitalista. No primeiro caso, os autores normalmente partem duma racionalidade universal que busca o lucro a todo custo, algo que só poderia ser consequência e não causa do modo de produção capitalista; no segundo, a explicação resulta dum alargamento da perspectiva: o imperativo do aumento da produtividade, cuja natureza é específica ao capitalismo, é considerado mero resultado dum suposto progresso continuado de melhoramento tecnológico, presente desde o início da humanidade (WOOD, 2002).
Em ambos os casos, o capitalismo é entendido como resultado da natureza humana, perdendo seu caráter de desenvolvimento histórico e ganhando vestes deterministas. Outra possibilidade de naturalização do capitalismo é dada pelo que foi chamado pela autora de modelo mercantil, que concebe o capitalismo como uma consequência natural da ação humana, cujo aparecimento é dado pela remoção de obstáculos para sua livre manifestação (WOOD, 2002).
O raciocínio por trás dessa perspectiva é o seguinte, de acordo com a autora:
Existindo ou não a inclinação natural para 'intercambiar, permutar ou trocar' (vinda da notável formulação de Adam Smith), indivíduos racionais egoístas têm participado de atos de troca desde o início da história. Esses atos, por sua vez, tornaram-se cada vez mais especializados a partir da crescente divisão do trabalho, acompanhada também por melhoramentos técnicos nos instrumentos produtivos. Em muitas dessas explicações, melhoramentos na produtividade podem ser a razão principal da especialização progressiva da divisão do trabalho, criando uma tendência que relaciona intimamente essas narrativas do desenvolvimento comercial e uma espécie de determinismo tecnológico. O capitalismo ou a sociedade comercial, o ponto mais alto de progresso, representa assim a maturação de antigas práticas comerciais — ao lado de avanços técnicos — e sua libertação de restrições político-culturais (WOOD, 2002, primeiro capítulo, tradução nossa)7.
O capitalismo e seu mercado se tornam, então, uma oportunidade que deve ser escolhida sempre que possível. A palavra oportunidade, aqui, é importante. Ela faz parecer que os agentes dentro do modo de produção capitalista são livres; faz com que os sujeitos da sociedade capitalista creiam em sua liberdade de escolha: as mercadorias que consomem, os empregos que possuem, as vidas que têm: todas essas coisas seriam representativas de sua abrangente agência no mundo (WOOD, 2002).
Todavia, como demonstra Wood (2002, primeiro capítulo, tradução nossa), a aparente liberdade do mercado capitalista esconde sua verdadeira forma:
Mas o que pode não estar sempre claro, mesmo nas abordagens socialistas, é que a característica distintiva e dominante do mercado capitalista não é a oportunidade ou a escolha, mas é, pelo contrário, a compulsão. No capitalismo, a vida material e a reprodução social são mediadas universalmente pelo mercado, de forma que todo indivíduo se veja obrigado a entrar em relações mercantis para acessar os meios de vida. Esse sistema específico de dependência do mercado significa que os ditames do mercado capitalista — seus imperativos de competição, acumulação, maximização de lucros e crescente produtividade laboral — regulam não só as transações econômicas, mas também as relações sociais8.
Isso é descrito por Marx em O Capital sob o nome de fetichismo da mercadoria. Mediante a contínua objetivação da produção, que tem como contrapartida a contínua desvalorização do aspecto social do trabalho, as mercadorias parecem ser, para seus criadores, objetos dados. A relação social entre os indivíduos aparenta ser uma relação entre as coisas: como o monstro de Frankenstein, a criatura se volta contra seu criador, assumindo sua posição de domínio (MARX, 2017).
Num primeiro momento de análise do debate da transição, afirma a autora, poderia parecer que Dobb ataca o modelo mercantil enquanto Sweezy o defende. Afinal, o livro de Dobb, além de representar um avanço nos estudos da transição, assemelhando-se em notabilidade à obra de Rodney Hilton, medievalista inglês e posterior participante do debate, também desafiou pressupostos do modelo mercantil: em especial, como já visto, a hipótese de que o capitalismo seria a simples expansão quantitativa do comércio, trazido à tona pelo ressurgimento das cidades e das relações de troca mercantil (WOOD, 2002).
Sweezy, entretanto, partindo das hipóteses de Henri Pirenne, iria em sentido contrário ao de Dobb e Hilton. Contudo, uma observação mais minuciosa traz à tona o fato de que tanto Dobb quanto Sweezy não foram capazes de escapar da influência do modelo mercantil, segundo a historiadora. Embora Dobb se afaste do modelo mercantil ao enfocar o campo e as lutas de classes que lá ocorriam, em detrimento das cidades e do crescimento comercial, respectivamente, o autor ainda permanece preso a ele por não distinguir entre a queda do feudalismo e a ascensão do capitalismo. Por considerá-los o mesmo momento, Dobb faz parecer que após o feudalismo necessariamente viria o modo de produção capitalista, algo somente possível se o capitalismo estivesse presente nos interstícios do modo de produção anterior, aguardando sua libertação. Eis, então, o modelo mercantil novamente (LENK, 2001).
Wood também critica a tese de Perry Anderson, proposta em seu livro Lineages of the Absolutist State (Linhagens do Estado Absolutista, em português), que responsabiliza o absolutismo pela separação entre exploração econômica e coerção política, dicotomia presente no período feudal. A autora afirma que Anderson, Dobb e Sweezy falharam no mesmo ponto: “todos presumem exatamente aquilo que precisa ser explicado, como o comércio (ou a produção mercantil) transforma-se em capitalismo (LENK, 2001, p. 155)”.
Por causa disso, os autores do debate da transição fizeram parecer que o artesão ou o camponês necessariamente se transformaria em capitalista após o desaparecimento das correntes feudais. A oportunidade, e não o imperativo, passa a descrever a natureza do mercado capitalista, interpretação indissociável do modelo mercantil. Em outras palavras, Dobb e Sweezy não conseguiram escapar duma perspectiva ainda muito filiada à naturalização do capitalismo.
Referências
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BARROS, José D’Assunção. Cidade medieval e feudalismo – um balanço da questão. Publicatio – Ciências Sociais Aplicadas, v. 16, n. 2, p. 289-300, ago. 2009. Disponível em: http://dx.doi.org/10.5212/PublicatioHum.v.16i2.289300. Acesso em: 29 set. 2021.
BRENNER, Robert. Dobb on the transition from feudalism to capitalism. Cambridge Journal of Economics, v. 2, n. 2, p. 121-140, jun. 1978. Disponível em: https://www.jstor.org/stable/23596403. Acesso em: 17 set. 2021.
DOBB, Maurice. A evolução do capitalismo. Rio de Janeiro: LTC, 1987.
FOSSIER, Robert. O trabalho na Idade Média. Petrópolis: Vozes, 2018.
HUBERMAN, Leo. História da Riqueza do Homem. 8. ed. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor, 1972. E-book.
LE GOFF, Jacques. A função econômica. In: LE GOFF, Jacques. O apogeu da cidade medieval. São Paulo: Martins Fontes, 1992. p. 39-54.
LENK, Wolfgang. Genealogia do capitalismo?. Leituras de Economia Política, Campinas, v. 8, p. 153-159, jun. 2001. Disponível em: https://www.economia.unicamp.br/images/arquivos/artigos/LEP/L8/LEP811Lenk.pdf. Acesso em: 12 nov. 2021.
MARIUTTI, Eduardo Barros. A transição do feudalismo ao capitalismo: um balanço do debate. Campinas: Unicamp, 2000. 200 f. Dissertação (Mestrado em História Econômica) – Instituto de Economia, Unicamp, Campinas, 2000. Disponível em: http://www.repositorio.unicamp.br/handle/REPOSIP/285509. Acesso em: 19 maio 2021.
MARX, Karl. O Capital: o processo de produção do capital. 2. ed. São Paulo: Boitempo, 2017. v. 1.
SKAZKINE, Sergey D. Problemas fundamentais da “segunda servidão” na Europa Central e Oriental. Crítica Marxista, n. 36, p. 63-92, 2013. Disponível em: https://www.ifch.unicamp.br/criticamarxista/arquivos_biblioteca/artigo293merged_document_274.pdf. Acesso em: 9 set. 2021.
SWEEZY, Paul. Uma crítica. In: SWEEZY, Paul et al. A transição do feudalismo para o capitalismo. 5. ed. São Paulo: Paz e Terra, 2004. p. 39-69.
SZELÉNYI, Iván. Marx’s Theory of History. 2011. (51m29s). Disponível em: YouTube. Acesso em: 26 abr. 2021. Transcrição disponível em: https://oyc.yale.edu/sociology/socy-151/lecture-12.
WOOD, Ellen Meiksins. The origin of capitalism: a longer view. 2. ed. London: Verso Books, 2002. E-book.
Dobb ressalta a importância da discussão de definições antes de abordar temas de pesquisa, pois, como explicita Mariutti (2000, p. 14): “[…] ao ligarmos um significado a um termo estamos adotando também um princípio de classificação, que virá a exercer influência sobre o resultado final da reflexão”.
Como aponta Hilton (2004), a popularidade da renda-trabalho ou da prestação de serviços durante o feudalismo é, muitas vezes, reflexo do volume de documentação disponível sobre esse tipo de contrato no século IX, concentrando-se no norte da França e no vale do Reno. A frequência da prestação de serviços nos documentos se confunde, então, com sua presença efetiva no mundo feudal.
Termo usado por Georges Duby como contraposição ao modo de produção feudal marxista. Na visão do medievalista, era necessário separar o sistema de exploração do trabalho do sistema de suserania e vassalagem (BARROS, 2009).
Cf. ROMERO, José Luis. Crise e Ordem no Mundo Feudoburguês. São Paulo: Palíndromo, 2005.
De acordo com Mariutti (2000, p. 9), isso ocorre repetidamente no debate: “Muitas vezes nos deparamos com situações curiosas: grande parte dos autores envolvidos na discussão parecem estar muito mais preocupados em verificar se suas proposições encontram guarida nos textos de Marx do que em confrontá-las com as novas evidências históricas obtidas após a sua morte”.
“[…] a resultante insegurança de vidas e bens, porém, ao invés de revolucionar os métodos de produção, como o faz a competição capitalista, apenas reforça a dependência mútua do senhor e dos vassalos, fortalecendo, portanto, a estrutura básica das relações feudais” (SWEEZY, 2004, p. 42).
“With or without a natural inclination to ‘truck, barter, and exchange’ (in Adam Smith’s famous formulation), rationally self-interested individuals have been engaging in acts of exchange since the dawn of history. These acts became increasingly specialized with an evolving division of labour, which was also accompanied by technical improvements in the instruments of production. Improvements in productivity, in many of these explanations, may in fact have been the primary purpose of the increasingly specialized division of labour, so that there tends to be a close connection between these accounts of commercial development and a kind of technological determinism. Capitalism, then, or ‘commercial society’, the highest stage of progress, represents a maturation of age-old commercial practices (together with technical advances) and their liberation from political and cultural constraints”.
“But what may not always be so clear, even in socialist accounts of the market, is that the distinctive and dominant characteristic of the capitalist market is not opportunity or choice but, on the contrary, compulsion. Material life and social reproduction in capitalism are universally mediated by the market, so that all individuals must in one way or another enter into market relations in order to gain access to the means of life. This unique system of market-dependence means that the dictates of the capitalist market – its imperatives of competition, accumulation, profit-maximization, and increasing labour-productivity – regulate not only all economic transactions but social relations in general”.